O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, não acredita que haja espaço no Supremo Tribunal Federal (STF) para que a defesa dos réus do mensalão (Ação Penal nº 470) consiga desmembrar o processo e levar parte do julgamento para primeira instância (por meio do recurso chamado questão de ordem). Ele também não vê margem legal para que a eventual renúncia de todos os réus que hoje têm mandato e direito a foro privilegiado suspenda a ação penal no STF.
“O Supremo já apreciou essas questões e entendeu que, no caso, o relacionamento entre as condutas era tão completo que não haveria como fazer esse desmembramento. Qualquer tentativa de reabrir a discussão a respeito é, sim, meramente protelatória”, ressaltou Gurgel. Segundo ele, além disso, a Corte “já decidiu que é absolutamente indispensável que todos os réus sejam submetidos à jurisdição do Supremo”. A renúncia de uma das pessoas com prerrogativa de foro privilegiado seria “uma clara tentativa de fraude”, acrescentou.
Gurgel participou na sexta-feira (9/12), em Brasília, de evento sobre o Dia Internacional contra a Corrupção, promovido pela Controladoria-Geral da União (CGU). A possibilidade de réus em processo de corrupção usarem recursos protelatórios para adiar e suspender julgamentos foi apontada como um dos principais mecanismos de impunidade para a corrupção.
O ministro-chefe da CGT, Jorge Hage, apontou como “um passo da maior importância” para evitar o uso desse expediente judicial a aprovação da chamada PEC dos Recursos, a Proposta de Emenda à Constituição nº 15/2011, que tramita na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado.
“Há uma infinidade de recursos e possibilidades de protelação, e os corruptos é que podem pagar os melhores escritórios de advocacia, que não deixam o processo chegar ao fim nunca, devido aos problemas de nossa legislação processual. Isso tem que mudar”, afirmou Hage.
Não há data prevista para o Congresso Nacional tratar da PEC dos Recursos: há 40 projetos de lei no Senado e 110 na Câmara dos Deputados (30 prontos para ir a plenário) aguardando decisão quanto à tramitação, informou o presidente da Frente Parlamentar Mista de Combate à Corrupção, deputado Francisco Praciano (PT-AM). “Tudo é lento no Congresso”, disse Praciano, ressaltando que, no caso dessas propostas, o Legislativo “não está ouvindo a população” sobre a a pauta da ética e do combate à corrupção.
Para o deputado, a falta de inciativa esvazia a atuação das duas casas do Congresso e força o governo a “legislar” por meio de medidas provisórias [MPs]. “Só no caso das ONGs [organizações não governamentais], temos 17 projetos pendentes sem tramitar. A [presidenta] Dilma [Rousseff] criou uma comissão para fazer uma MP para regulamentar a relação entre ONGs e Estado. Ou seja, o Congresso não faz o papel lá. Parabéns à presidenta”, enfatizou.
Na abertura do evento, a ministra Gleisi Hoffmann, chefe da Casa Civil, destacou que a presidenta Dilma não tolera “qualquer espécie de desvio de conduta” e vai zelar “sempre pela elevação dos padrões éticos e de probidade da administração federal”.
Desde junho, seis ministros pediram exoneração do governo. Dados da CGU indicam que, desde 2004, foram afastados dos cargos 3.500 agentes públicos por envolvimento em corrupção. Destes, 300 ocupavam altos cargos de direção. O advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, destacou que, nesse período, além dos desligamentos, melhoraram os índices de recuperação de recursos desviados pela corrupção.
A chamada recuperação de ativos passou de 1%, em 2007, para cerca de 15% este ano. Segundo Adams, desde 2002, R$ 1,5 bilhão foram recuperados – cerca R$ 600 milhões somente neste ano. “A recuperação, mostrando-se como um processo constante e efetivo, reduz o senso de impunidade, reduz a percepção do corrupto de que pode praticar a corrupção porque vai ficar impune”. A meta da AGU é atingir 25% de recuperação de ativos desviados em 2016.